Nos últimos anos, uma palavra tornou-se obrigatória ao se falar em petróleo no Brasil: pré-sal. Não é para menos. As imensas descobertas feitas no nosso subsolo marítimo, em profundidades próximas dos sete mil metros, já colocaram o Brasil sob os olhares atentos de todo o mundo e farão do país uma potência energética mundial nos próximos anos. Até 2022, o volume recuperável descoberto poderá alcançar 55 bilhões de barris de óleo equivalente (petróleo e gás), o que posiciona o país no ranking das maiores reservas globais.
O combustível da transição energética
O pré-sal também abriu as portas do país para outra oportunidade histórica: o desenvolvimento de um novo mercado de gás natural (GN). Em um cenário de mudança para uma economia de baixo carbono, o gás natural é o combustível dessa transição energética. Isto porque, o gás natural, é o mais ambientalmente favorável entre os combustíveis fósseis.
Além disso, este energético tem um papel muito importante ao ser complementar à geração de energia de fontes intermitente, como hídrica, eólica e solar. Ou seja, o gás natural garante a produção de energia elétrica quando há redução da oferta de energia por alguma outra fonte renovável. Dessa forma, contribui para o país atingir suas metas de redução de emissões (substituindo outros combustíveis fósseis), assegurando o fornecimento de energia.
Maior transformação dessa indústria: R$ 50 bilhões em novos investimentos
De acordo com a empresa de Pesquisa Energética (EPE), a oferta potencial nacional de gás natural passará de 59 milhões de m³/dia em 2018 para 147 milhões de m³/dia em 2030. Deste total, 45% serão produzidos em áreas localizadas no pré-sal.
Além do crescimento na produção nacional, as recentes melhorias regulatórias vão permitir a entrada de novos agentes e abrir grandes oportunidades de negócios no país. O Ministério de Minas e Energia estima que, até 2030, o novo mercado de gás natural pode atrair R$ 50 bilhões em novos investimentos.
É a maior transformação dessa indústria no Brasil desde o seu início, em meados dos anos 1980. O novo mercado vai significar maior pluralidade de empresas atuando na produção, no processamento, no transporte e na distribuição do energético.
Podcast: Décio Oddone e Luiz Costamilan debatem Novo Mercado de Gás Natural
Décio Oddone, diretor-geral da ANP (Agência Nacional de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis), e Luiz Costamilan, secretário-executivo de Gás Natural do IBP (Instituto Brasileiro de Petróleo, Gás e Biocombustíveis), explicam como vai funcionar o Novo Mercado de GN e debatem as oportunidades que esta revolução traz para o Brasil.
O que o Brasil ganha com isso?
A entrada de novos agentes no setor dá a chance de ampliar a oferta do gás natural a novos mercados – levando o insumo a outras regiões do país, para além do litoral – e de tornar o seu preço mais competitivo. Ganham as empresas e o consumidor.
Como o gás natural é um combustível muito utilizado na indústria, o aumento da oferta do produto, a um preço competitivo, pode incentivar novos investimentos de outras áreas do setor produtivo que usam o gás como insumo relevante na sua produção. Exemplo é a indústria química, de cerâmica, de alumínio e vidro.
Nos EUA, o aumento da oferta de gás natural em reservatórios não convencionais a preços mais competitivos foi um dos responsáveis por reativar a produção industrial norte-americana com impactos para toda a economia.
Marco regulatório: aperfeiçoamento nas regras para abertura do mercado
Para garantir a entrada de novos agentes no setor de gás natural e atrair mais investimentos são necessários aprimoramentos regulatórios. Os primeiros passos foram dados. Em 2019, o Conselho Nacional de Política Energética (CNPE) e o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) estabeleceram políticas (Resolução 16/2019) com foco na abertura e que marcam o fim do monopólio da Petrobras no setor (TCC – Termo de Compromisso de Cessação).
Além disso, foi lançado o programa Novo Mercado de Gás Natural, que dará continuidade às ações necessárias para o aperfeiçoamento do marco regulatório do setor. É um rol extenso de mudanças que envolve diferentes agentes, governos, Congresso e sociedade.
Entre elas, está a necessidade de estruturar as diretrizes de acesso à infraestrutura de transporte, de escoamento, de processamento do gás e terminais GNL; e de definir as regras para mudança da contratação de transporte do modelo atual (ponto a ponto) para o modelo de contratação de capacidade de entrada e saída. Essa mudança vai permitir que a injeção ou retirada do gás possa ser feita por diferentes agentes em qualquer ponto do sistema de transporte.
É também importante que sejam feitas melhorias quanto à tributação e a legislação nos estados. Um dos desafios é ampliar a regulamentação da figura do consumidor livre, aquele que pode escolher de qual fornecedor quer adquirir a molécula de gás. Os estados do Rio de Janeiro e Sergipe têm sido pioneiros no aprimoramento de suas regulações, permitindo que o consumidor livre possa escolher seu supridor de gás natural.
Um mercado mais competitivo vai permitir ao país, por exemplo, ampliar sua malha de gasodutos de transporte. Hoje, para se ter ideia, temos 9.400 quilômetros de dutos. A Argentina, com apenas ⅓ da dimensão do Brasil, tem uma rede 70% maior. Os EUA, referência mundial, tem cerca de 500 mil km.
Consumo de gás no mundo cresceu a partir dos anos 70
Em todo o mundo, o gás natural é utilizado desde o século XIX, mas a disseminação do consumo ocorreu a partir da década de 1970, após o choque de oferta do petróleo, que levou a um forte aumento no preço deste produto. A necessidade de reduzir a dependência do óleo criou condições para o crescimento da indústria do gás natural