A reinjeção de gás natural é uma técnica usada em todo o mundo para aumentar a produção de petróleo. Em reservatórios onde há presença dos dois energéticos – gás natural e petróleo -, é comum que o gás natural seja extraído e, em seguida, reinjetado para manter a pressão do poço com efeitos na movimentação dos fluidos na jazida, permitindo produzir mais óleo. Na camada do pré-sal, bem como em outros campos de petróleo brasileiros, há predominância de reservatórios de petróleo com gás natural associado (produzido ao mesmo tempo que o óleo).
Quase R$ 1 trilhão a mais na arrecadação e menor impacto ao meio ambiente
Nos últimos anos, com as descobertas das grandes reservas no pré-sal, o volume de gás natural reinjetado no Brasil aumentou. Esse crescimento, como será detalhado a seguir, é explicado pelas características particulares desses campos, como qualidade dos hidrocarbonetos e condições de produção.
O crescimento da reinjeção traz resultados positivos para o país. O maior volume de óleo extraído resultante da reinjeção pode representar um aumento de quase R$ 1 trilhão na arrecadação de impostos, recursos gerados a partir de 25 FPSOs (sigla em inglês para o navio-plataforma utilizado na extração de petróleo) em campos do pré-sal, com entrada em operação até 2030.
Hoje, a reinjenção é uma das ferramentas mais relevantes para agregar valor aos projetos de Exploração & Produção de petróleo e gás natural. Além disso, também permite atender a requisitos ambientais no processo de produção, ao reduzir a emissão de CO2 na atmosfera pela queima.
Reinjeção de gás natural no pré-sal: como funciona e quais benefícios
A reinjenção, no entanto, tem sido muitas vezes tratada sem a necessária base de conhecimento, que envolve diferentes áreas como geologia, engenharia de reservatório, dinâmica de fluidos, simulação computacional e economia, etc. Por isso, o Além da Superfície consultou especialistas do IBP (Instituto Brasileiro de Petróleo e Gás Natural) para responder às principais perguntas, esclarecendo como funciona esta importante etapa do processo de produção de óleo e gás.
1 -O que é a reinjeção e por que é necessária no pré-sal?
É o processo de reinjetar gás natural no reservatório após sua produção. Listamos a seguir os principais motivos que explicam por que a reinjeção é utilizada como ferramenta importante nos campos do pré-sal.
O primeiro é aumentar a produção de petróleo, garantindo a viabilidade econômica da área. Estudos citados em relatórios divulgados este ano pela ANP (Agência Nacional de Petróleo e Gás Natural) e pela EPE (Empresa de Pesquisa Energética) estimam que a reinjeção pode elevar em 25-30% o volume recuperável de petróleo do campo, se comparada a gestão do campo apenas com injeção de água. Além disso, em muitos casos, o campo só é viável se houver a reinjeção.
O segundo motivo é a qualidade do gás natural das reservas na camada de pré-sal. O teor de CO2 pode chegar em alguns campos a mais de 40%, o que, por problemas de corrosão, torna impraticável sua movimentação por dutos. Como existem limitações tecnológicas para a separação de contaminantes (como o CO2) das correntes de gás natural offshore, o produtor é obrigado a reinjetar parcela do gás natural produzido. Além disso, quanto maior o percentual de CO2, menor o volume de gás natural que sobra. Por exemplo, para correntes com 20% de CO2, cerca de 44% do gás natural produzido fica indisponível para a exportação por gasodutos.
A reinjeção é uma alternativa à queima de gás natural, que tem restrições em diversas regiões produtoras do mundo, incluindo o Brasil, evitando impactos ao meio ambiente, com efeitos no clima.
Além disso, a reinjeção de gás permite a produção em cenários em que não há mercado com a escala e a previsibilidade para o consumo de gás natural. Trata-se de uma circunstância que visa a manutenção da geração de benefícios a partir da produção de petróleo. A reinjeção, neste caso, atua como fonte de flexibilidade para a modulação da produção de gás natural.
O que acontece com o gás natural reinjetado?
Ao contrário do que é divulgado, a reinjeção de gás natural não é um desperdício de recursos, já que serve para otimizar a produção do campo. Além disso, a parcela do gás natural reinjetado que se acumula na capa da jazida pode ser reaproveitada no futuro.
A reinjeção ocorre porque não há gasodutos suficientes para o gás chegar ao mercado?
Não. A infraestrutura atual de escoamento (do campo offshore até o continente) assegura o atendimento à demanda doméstica até 2027. Até o final de 2021, a Rota 3 entra em operação para escoar novos volumes de gás natural do pré-sal. Depois disso, a identificação de novas demandas definirá a necessidade de construção de novas rotas de escoamento.
Reinjetar não impede o aumento da oferta de gás natural?
Essa é uma afirmação comum e incorreta. O aumento da oferta de gás natural não é impedido pela reinjeção. A oferta dependerá, de fato, da identificação de demandas-âncora de gás, alternativas de estocagem e/ou de criação de um mercado competitivo, líquido e com escala.
Outra questão é a localização. Os campos do pré-sal estão situados a distâncias superiores a 200-300 km da costa, exigindo, de acordo com a EPE, projetos multibilionários (R$ 8 bilhões) para o escoamento e unidades de processamento. Esses projetos só serão viáveis se forem identificadas demandas-âncora de gás com a escala e previsibilidade de consumo. De nada serviria a infraestrutura, sem a demanda.
Qual a importância da reinjeção na decisão da empresa de realizar investimento?
Em muitos casos, a reinjeção é decisiva para o campo ser economicamente viável, ou seja, para haver ou não o desenvolvimento da produção. Após a descoberta de um campo de petróleo, tem início a avaliação sobre a sua viabilidade comercial (características dos reservatórios e as alternativas de desenvolvimento do campo de petróleo).
A escolha dos volumes de reinjeção é uma das etapas desses estudos, na medida em que permite aumentar o volume de óleo produzido, com impactos na geração de valor para as empresas e a sociedade. Quanto maior a produção, maior é a arrecadação. No caso do pré-sal, a carga fiscal nos contratos de partilha pode ser superior a 70%. Ou seja, de cada R$ 10 de resultado operacional, mais de R$ 7 são direcionados aos cofres públicos.
Responsáveis pela gestão dos reservatórios, os produtores são os maiores interessados em viabilizar os projetos com o melhor benefício para todas as partes. Interferências na busca da melhor solução econômica para os volumes de reinjeção, sem paralelo em ambientes de mercado aberto no mundo, pode afetar a competitividade desta indústria no país, reduzindo a atratividade dos negócios e sendo um desincentivo a futuros investimentos.
O governo perde ‘royalty’ quando ocorre a reinjeção?
Não. Como a reinjeção aumenta o fator de recuperação de petróleo, os montantes arrecadados com participações governamentais tendem a aumentar substancialmente.