Os desafios para a transformação do downstream no Brasil

IBP
ATUALIZADO EM dezembro 2020

Além de décimo maior produtor de petróleo, o Brasil é um dos dez maiores mercados para derivados de óleo do mundo. É um setor que movimenta formalmente um volume de 125 bilhões de litros, fatura R$ 450 bilhões e recolhe R$ 150 bilhões em tributos, dos quais R$ 92 bilhões referentes apenas ao ICMS. Em todo país, são 41 mil postos de serviços.

Os desafios para a transformação do downstream no Brasil
Esse é o downstream brasileiro, o segmento que atravessa uma das maiores transformações da sua história e que viu, nesta pandemia, uma aceleração na mudança de hábitos de mobilidade do consumidor. Este foi o cenário traçado por especialistas e executivos das principais empresas do setor reunidos na Rio Oil & Gas 2020. Em comum, eles defendem a necessidade de aperfeiçoamentos regulatórios, logísticos e tributários para que o país possa enfrentar esse cenário de mudanças, marcado pela transição energética e pelos desinvestimentos da Petrobras no segmento de refino.

José de Sá, Senior Partner da Bain&Company, destacou que o fato de o Brasil ser um dos maiores mercados no mundo cria oportunidades para refinadores, distribuidores, varejistas, traders, players de infraestrutura e outros. “O timing dos desinvestimentos da Petrobras é excelente. O Brasil precisa se plugar com o que acontece no refino mundial e remover as barreiras para evoluir.”

Em dois anos, a Petrobras passará de 98% do controle do refino para cerca de 50%, considerando terminais e dutos, além da venda da participação na Braskem, na BR Distribuidora e em outras subsidiárias. “Nossa estratégia é reduzir custos, aumentar a eficiência energética, avançar na descarbonização das operações, compliance, governança, capacitar nosso time interno para a abertura. Seremos competidores fortes e ágeis nesse novo cenário”, afirmou Anelise Lara, diretora-executiva de Refino e Gás Natural da Petrobras.

Marcelo Araújo, CEO da Ipiranga, disse que “o desinvestimento e outros movimentos vão mudar profundamente o mercado de downstream”. “É a maior transformação desde a criação da Petrobras. Vai muito além de desinvestimento. Com essas mudanças, serão gerados múltiplos processos de suprimento, novos modelos de negócios, relacionamento comercial e, principalmente, maior atração de investimento”. Ele defende segurança jurídica e um modelo tributário menos complexo, que reduza as distorções.

Sobre a abertura no downstream, Rafael Grisolia, CEO da BR Distribuidora defendeu mudanças regulatórias que destravem os investimentos, bem como o combate ao mercado irregular. “É muito importante uma competição sadia, com as mesmas regras para todos. Mas temos que estar atentos ao roubo de combustíveis e à evasão fiscal. E a tecnologia é aliada para monitorar esse sistema”, afirmou.

Mudanças nos hábitos do consumidor

Na visão de Araújo, 2020 acelerou um processo de jornadas mais digitais e com menos contato. Neste sentido, o CEO expôs que o objetivo da empresa é servir como um agente de conveniência e praticidade na jornada de mobilidade dos consumidores, oferecendo soluções que se adequem aos novos hábitos.  “Não importa se é veículo compartilhado, carro elétrico ou movido a células de hidrogênio, as pessoas sempre estarão em mobilidade. Nós seguiremos servindo nosso propósito de conhecer e atender a demanda das pessoas”, diz.

Para Grisolia, a pandemia trouxe mudanças na mobilidade, no turismo e na aviação. “A transição energética também influencia mais as decisões dos clientes. E a BR Distribuidora reforçou seu propósito de entregar energias, de buscar o melhor para o ser humano, de entregar valor para a sociedade”, afirmou.

Na opinião de Ricardo Mussa, CEO da Raízen, o mercado brasileiro de distribuição é sustentável e ainda vai crescer por até 20 anos, pois atende às expectativas da sociedade. “As pessoas estão mais atentas com saúde, meio ambiente, os critérios ESG (sigla para Social, Governança e Meio Ambiente). Isso veio para ficar e trouxe um prêmio efetivo inédito”, disse.

Mercado irregular de combustíveis

Alta tributação e baixas margens brutas da distribuição, da logística e da revenda fazem com que seja atrativa a prática de sonegação, inadimplência contumaz, vendas sem documento fiscal, simulação de operações fictícias e adulteração. Segundo a FGV, em 2019, a sonegação e a inadimplência do setor somaram R$ 7,2 bilhões. Essa prática gera prejuízos, desestimulando investimentos e reduzindo receitas dos governos.

Carlo Rodrigo Faccio, diretor do Instituto Combustível Legal (ICL), defendeu que, além da necessidade da reforma tributária, outra solução para reduzir os problemas no setor é o uso de vacinas tecnológicas, como bombas criptografadas e monitoramento de cargas em trânsito.

Biocombustíveis: alternativas para descarbonização do setor

Em um cenário de transição energética, os biocombustíveis são uma das principais alternativas para a descarbonização do setor. “Hoje o Brasil é o segundo maior produtor de etanol e o segundo de biodiesel. Essa história de sucesso não garante o sucesso do futuro. Temos que avançar na adoção de políticas públicas que permitam uma sinergia cada vez maior entre os biocombustíveis e os outros mercados”, defendeu Valeria Amoroso Lima, Diretora Executiva de Downstream do IBP (Instituto Brasileiro de Petróleo e Gás).

Heloisa Borges Esteves, Diretora de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis da EPE (Empresa de Pesquisa Energética), acredita na força dos biocombustíveis como a solução energética para o Brasil. “Quando falamos do caminho para o biomercado, temos claro que o processo terá de se adequar às características de cada país e a agenda climática influenciará cada vez mais o comércio e as relações internacionais. As políticas adotadas para os biocombustíveis devem estar em constante evolução, de forma a manter a segurança energética e promover o desenvolvimento social e econômico, atendendo aos requisitos da sustentabilidade”.

Para Claudio Rogerio Linassi Mastella, Gerente Executivo de Comercialização da Petrobras, é preciso apostar nas novas tecnologias dos biocombustíveis avançados. “Todos os biocombustíveis precisam ser incentivados e a utilização de soluções locais permitirá o desenvolvimento de processos e produtos e impulsionará o sucesso de programas como o Renovabio. Os principais mercados tratam a descarbonização de forma ampla e não por mandatos volumétricos para biocombustíveis específicos”.