A importância dos biocombustíveis na transição energética

Transição Energética
Publicado em 12 de setembro de 2024 | Atualizado em 10 de setembro de 2024

A transição para uma matriz energética de baixo carbono passa por alternativas que reduzam significativamente as emissões de gases de efeito estufa (GEE), e os biocombustíveis emergem como uma das soluções mais promissoras nesse cenário. Com uma combustão mais limpa e a capacidade de emitir até 80% menos GEE em comparação às fontes fósseis, os biocombustíveis são uma peça-chave na descarbonização do setor de transporte.

Segundo a Agência Internacional de Energia (AIE), a demanda mundial por biocombustíveis líquidos tende a crescer nos próximos anos, podendo atingir 906 mil metros cúbicos diários até 2030, no cenário mais otimista. No entanto, apesar de seu potencial, o caminho para que os biocombustíveis se tornem uma opção amplamente competitiva e acessível ainda enfrenta desafios significativos, exigindo esforços contínuos em inovação e desenvolvimento tecnológico.

O que são biocombustíveis?

São combustíveis derivados de matérias-primas orgânicas, geralmente plantas ou produtos agrícolas, que podem ser usados para abastecer veículos, máquinas e usinas de energia, substituindo, de forma parcial ou total, combustíveis de origem fóssil.

Os biocombustíveis líquidos são os mais amplamente utilizados no Brasil, e representam uma categoria de combustíveis derivados de fontes vegetais ou animais que permanecem no estado líquido em condições normais de temperatura e pressão. São exemplares dessa configuração o etanol, o biodiesel éster, o Diesel Verde e o Sustainable Aviation Fuel (SAF).

  • O etanol é uma substância química cuja produção ocorre principalmente pela fermentação de açúcares. É utilizado em motores de combustão interna com ignição por centelha (conhecido como ciclo Otto), sendo uma alternativa à gasolina. Entre os tipos de etanol, encontram-se o anidro, que apresenta um teor de água inferior a 1% e que é adicionado a gasolina, e o hidratado que pode ser utilizado puro. Quanto à matéria-prima utilizada na sua produção, o etanol pode ser classificado como de primeira geração (1G) ou segunda geração (2G). O etanol de primeira geração é produzido a partir de culturas agrícolas ricas em açúcares ou amido, como cana-de-açúcar e milho. Já o etanol de segunda geração é obtido a partir de resíduos agrícolas, como bagaço de cana e palha, com ganho expressivo de produtividade na mesma área plantada. Ambos são quimicamente idênticos e podem ser processados para obter tanto o etanol anidro quanto o hidratado.
  • O Biodiesel Éster e o Diesel Verde (também conhecido como Diesel Renovável ou HVO) são biocombustíveis destinados ao funcionamento de motores de combustão interna (ciclo diesel) que utilizam ignição por compressão ou, de acordo com as normativas vigentes, pode ser empregado na produção de outras formas de energia, com a capacidade de substituir, em parte ou por completo, os combustíveis derivados de recursos fósseis.
  • O Sustainable Aviation Fuel (SAF) é um combustível de aviação sustentável obtido por fontes renováveis, a partir de diversas rotas tecnológicas já aprovadas pela American Society for Testing and Materials (ASTM), atendendo aos padrões de qualidade e sustentabilidade. Por definição da ICAO – Organização Internacional da Aviação Civil, o produto deve reduzir em pelo menos 10% as emissões de GEE em comparação ao jet fóssil.

Tanto o Diesel Verde como o SAF são combustíveis “drop-in”, ou seja, são quimicamente análogos aos seus respectivos fósseis, diesel e querosene de aviação, podendo ser incorporados diretamente em sistemas de abastecimento existentes, sem a necessidade de adaptações.

Combustíveis renováveis sintéticos

Os chamados “e-fuels” ou combustíveis sintéticos não são classificados como biocombustíveis, pois não utilizam matérias-primas orgânicas em sua produção. No entanto, são considerados combustíveis renováveis. Eles são obtidos por meio de processos de síntese química, que utilizam dióxido de carbono (CO₂) capturado da atmosfera e hidrogênio obtido por eletrólise da água com energia elétrica proveniente de fontes renováveis. Embora os combustíveis sintéticos ofereçam consideráveis benefícios ambientais, como a redução das emissões de gases de efeito estufa e a compatibilidade com as infraestruturas existentes, seu desenvolvimento ainda está em estágio emergente. A produção em larga escala enfrenta desafios substanciais, especialmente em relação aos altos custos e à eficiência energética dos processos envolvidos.

Cenário brasileiro

O Brasil é o 2º maior produtor mundial de biocombustíveis, responsável por 72.337 m³/d (21,9%), atrás apenas dos Estados Unidos, com uma produção de 127.821 m³/d (38,8%).

Com uma longa tradição na implementação de políticas públicas e de articulação com o setor privado para impulsionar o desenvolvimento dos biocombustíveis, o país tem um perfil de produção concentrado em etanol (anidro e hidratado) e biodiesel, com aproximadamente 360 e 59 unidades produtoras, respetivamente. Em 2023, os dois insumos responderam por 22,5% da demanda de energia no setor de transporte.

Políticas públicas de biocombustíveis no Brasil

As políticas públicas de incentivo à produção e uso de biocombustíveis no Brasil podem ser segmentadas em três eixos: mandato compulsório, RenovaBio e alíquotas tributárias diferenciadas entre os combustíveis fósseis e os biocombustíveis que competem nos postos de abastecimento.

O mandato compulsório tem o objetivo de incentivar o aumento da participação dos biocombustíveis na matriz de transporte desde o século XX. A mistura de etanol anidro à gasolina A tem sido realizada desde o século passado, evoluindo ao longo do tempo e, desde 2015, estipulada em 27%. Já no caso do diesel, a adição obrigatória e gradual de biodiesel éster ao óleo diesel A começou em 2008. Desde então, os mandatos de mistura foram aumentando de 2% para os atuais 14%.

Instituído a partir da lei nº 13.576 de 2017, o RenovaBio tem como objetivo expandir a produção de biocombustíveis, alinhando-se com os compromissos de redução de emissões de GEE assumidos pelo Brasil no Acordo de Paris.

O programa utiliza como principal ferramenta a definição de metas anuais de redução das emissões de carbono para o setor de combustíveis. Isso tem o propósito de estimular a produção e a utilização de biocombustíveis no panorama de transportes do país.

Já a diferenciação de alíquota tributária entre os biocombustíveis e os combustíveis fósseis confere um diferencial competitivo tributário entre os produtos que competem diretamente nos postos de abastecimento.

PL Combustível do Futuro

Em tramitação no congresso, o Projeto de Lei “Combustível do Futuro”, PL 528/20, tem o objetivo de avançar na agenda de descarbonização do setor de transporte no país, integrando ferramentas de política pública já existentes e instituindo novas ferramentas para o setor de transporte.

Entre os seus pilares estão a criação do Programa Nacional de Combustível Sustentável de Aviação; a regulamentação dos combustíveis sintéticos; a instituição do Programa Nacional de Diesel Verde (PNDV); o RenovaBio, o MOVER e o PBE Veicular; e a possibilidade de elevação do limite máximo de adição de etanol à gasolina de 27% para 35%, desde que estabelecido pelo poder Executivo.