Ter habilidades comportamentais, construir relacionamentos, saber gerenciar projetos e fazer as perguntas certas são algumas das características que o jovem talento deve ter para se destacar no mercado de trabalho. Para entender melhor o perfil do profissional do futuro, o Além da Superfície conversou com Mariana Reis, especialista em empregabilidade, transição de carreira e recolocação. Ela é autora do livro “Me formei, e agora?”, voltado para o jovem que está iniciando sua jornada profissional.
Confira a entrevista completa e veja as dicas da especialista para se preparar melhor para os processos seletivos.
Além da Superfície – Quais as habilidades que os jovens precisam ter para ingressar no mercado de trabalho?
Mariana Reis – Primeiro é importante entender que hoje todos somos contratados, promovidos e desligados muito mais pelas habilidades comportamentais do que pela parte técnica. O comportamento é saber fazer acontecer e o técnico é o saber, o conhecimento em si. O problema que temos hoje no mercado é que muita gente sabe, mas pouca gente sabe transformar esse conhecimento em ação. Eu vou elencar aqui as cinco principais características que eu acho mais importantes.
A primeira delas, para a indústria de óleo e gás e a indústria como um todo, é a autogestão. Para mim, essa é uma habilidade muito importante para o profissional do presente e do futuro. Ela é a capacidade de fazer gestão de si sozinho, a palavra autogestão está muito conectada com autonomia. É saber aprender, ter senso de urgência, saber priorizar as tarefas, é saber fazer uma boa gestão do tempo. Hoje, depois da pandemia, a gente entrou no modelo híbrido e eu, como recrutadora, preciso contratar alguém que seja produtivo de dentro de casa, do café, de qualquer lugar do mundo.
Outro ponto é a flexibilidade e adaptabilidade. A única certeza que a gente tem é que tudo vai mudar, cada vez mais rápido e em ciclos econômicos cada vez mais curtos. Então, o mercado nunca precisou tanto de profissionais flexíveis e adaptáveis.
Outra característica é ter o perfil articulador, que é quando o profissional sabe usar o seu ativo de relacionamento a seu favor, ou seja, se ele não sabe resolver, ele sabe de alguém que resolve. É aquele perfil da pessoa que se movimenta, que não espera a solução cair no colo, ele é articulado e investe no ativo de relacionamento.
Uma quarta característica, que acaba ficando entre comportamental e técnica, é curadoria de informações e conhecimentos. Para mim, essa é uma das principais habilidades do profissional do futuro. Hoje em dia, nós temos um boom de informação. Então, não faz mais diferença quem tem acesso à informação, porque isso já está mais plural. Faz diferença quem sabe discernir o que é fonte segura e o que não é. É muito importante o profissional saber quais são as três fontes de informação mais segura da sua área de atuação. No caso da indústria de óleo e gás, por exemplo, nós temos o IBP como uma fonte segura nesse tema. Eu vejo na prática, como recrutadora de talentos, muita gente tomando decisões erradas por estar trazendo dados falhos para seu negócio. Os jovens talentos, principalmente, precisam se atentar a esse ponto, porque está cheio de especialista de rede social surgindo todo dia. Não dá para tomar uma decisão baseado em uma informação que está na internet sem você checar se tem uma base técnica ou vem de uma fonte realmente segura. O mercado do futuro não é de quem tem a resposta certa, mas de quem está fazendo a pergunta certa. E pergunta certa não está pronta em lugar algum, nem em ferramentas de inteligência artificial. Para fazer a pergunta certa você precisa entender de cenário, levar em consideração fontes seguras, traduzir essas informações em cenários para formatar uma pergunta estratégica.
E, por fim, a colaboração. A gente passou no mercado de uma gestão funcional para uma gestão matricial, com a globalização, e agora está numa gestão projetizada. Na indústria de óleo e gás se trabalha muito com esse tipo de gestão com projetos e contratação de fornecedores por projeto. Essas equipes precisam ter características multidisciplinares, com pessoas de diferentes áreas de formação trabalhando juntas. Nesse contexto, o profissional precisa trabalhar muito bem com suas interfaces, precisa saber buscar informações com essas interfaces, precisa de colaboração.
A gente falou das habilidades comportamentais. Quais são as habilidades técnicas que esse jovem profissional precisa ter?
Considerando a indústria de óleo e gás, existem três habilidades técnicas que eu acho extremamente importantes. Primeira, gestão de projetos. Por ser uma indústria que trabalha muito com gestão projetizada, investir nesse conhecimento de gestão de projetos, metodologias ágeis e ferramentas é muito importante.
Segundo ponto, gestão de risco. Embora fique dentro de gestão de projetos, é uma visão, um modelo mental que eu acho muito importante para a indústria de óleo, gás e energia, porque você precisa ter sempre um plano para mitigar o risco, porque um processo que dê errado nessa indústria pode causar grandes danos. Sempre que estou recrutando para essa indústria, eu vejo se esse candidato, seja jovem ou para um cargo de alta gestão, tem uma visão apurada para a gestão de risco.
E o terceiro ponto, que eu chamo da tríade de gestão, é processo. Hoje em dia, fala-se muito em inovação, e essa indústria também é muito focada em inovar, só que é preciso tratar desse tema sem romantismo. E esse é um erro do jovem talento, que confunde criatividade com inovação. Criatividade é comportamento, inovação é processo. Tem muita gente que é criativa, mas criatividade é meio da informação, não é fim, e tem muita gente tratando criatividade como se fosse o fim da inovação. Criatividade está na sua mente, você precisa tirar isso da sua mente e transformar em uma melhoria de processo real. Se você é um jovem talento que está iniciando nessa indústria, como estagiário ou trainee, faça duas coisas: primeiro, antes de querer inovar, faça muito bem a sua rotina, faça o básico bem feito; segundo, não se conforme com aquela rotina, critique, olhe para ela e sugira novas formas de fazer algo. Para inovar, você não precisa de milhões de reais, você pode apenas olhar para sua rotina e sugerir uma nova forma de fazer algo, você pode inovar no seu dia a dia.
Como os jovens talentos devem se preparar para um processo seletivo na indústria de óleo e gás?
Eu escrevi o livro justamente para ajudar os jovens talentos a se inserirem e se destacarem no mercado de trabalho. Para abordar a indústria de forma mais assertiva, você precisa se preparar fazendo muito bem seu currículo, seu LinkedIn e ter uma boa narrativa sobre sua trajetória. Um currículo bem-feito é objetivo, e a parte mais importante dele é como você explica para o recrutador sua experiência, e aqui entra também experiência acadêmica, trabalho voluntário. Tudo é experiência hoje, o mercado mudou em relação a isso, não é só mais o que está na carteira de trabalho.
Escreva suas experiências em tópicos, o foco deve ser na ação e resultado, e pesquise as palavras-chaves da sua área de atuação. Hoje, antes de você convencer o recrutador, você precisa convencer o robô, porque, quando você se cadastra em vagas online, está conversando com um sistema, e ele precisa das palavras-chaves para te levar ao próximo passo do processo. Então, para se destacar em um processo hoje, você precisa saber quais são essas palavras-chaves que o mercado está pedindo da vaga que você quer. Como você faz isso? Pesquise, leia, pelo menos, 20 descrições de cargos da vaga que você quer. Vá entender o que o mercado está pedindo daquilo que você quer. Aí, você olha para sua história e vê, do que está sendo pedido, o que você tem na sua experiência profissional, acadêmica, freelancer e, então, escreve isso de forma orientada ao mercado. Quem não tem LinkedIn faça urgente, pois está perdendo uma chance diária de ser abordado por recrutadores do mundo inteiro.
E como se preparar para conseguir demonstrar essas habilidades comportamentais que você citou numa entrevista de emprego?
Saiba responder muito bem à pergunta “Me conte um pouco mais sobre você”. Lembre-se de contar a sua história conectada àquela vaga daquela empresa naquele momento de vida. Não adianta você contar sua história da forma como você acha legal, ignorando o que a vaga precisa. Hoje, passa na entrevista quem tem a maior sensibilidade para entender o que aquela vaga precisa naquele momento. A vaga tem uma dor e vai passar quem convencer que vai contribuir para sanar aquela dor. A gente precisa se apresentar de uma forma que fale bem de nós mesmos, conte a nossa história, coloque nossa personalidade, mas sem esquecer que a gente está ali para sanar uma dor também.
Quais são as dificuldades que vocês têm no recrutamento de talentos?
O que mais encontro nas entrevistas são pessoas querendo vender algo sobre quem são que nem elas mesmas compraram. Recolocação profissional ou conseguir o cargo dos seus sonhos é sobre se vender. Para isso, você precisa ter história para contar e, para ter história, você precisa ter se movimentado. Quando eu peço para a pessoa me contar mais sobre ela, muitas vezes ela não sabe o que dizer, porque não tem uma boa narrativa ou não tem mesmo uma história para contar. Se ela não tem história, é porque ela não se movimentou. O jovem que sai na frente hoje é aquele que se movimenta mais cedo. Se você for esperar o último ano de faculdade para procurar alguma oportunidade, vai ficar para trás, porque tem muito jovem trabalhando desde 18 anos como freelancer, fazendo trabalho voluntário, em empresa júnior da faculdade, envolvido em experiência acadêmica, construindo a sua história.
O jovem que quer se destacar precisa se movimentar cedo, sim! Você precisa saber responder quais são as suas cinco principais forças e fraquezas técnicas e comportamentais. E você só vai conhecê-las se movimentando. Se você não sabe essa resposta na ponta da língua, não consegue se defender. Se você não conhece seus próprios atributos, como você vai se vender para alguém?
Um conselho que eu dou para o jovem é: no primeiro dia de aula, na primeira semana, pergunta na sua instituição de ensino quais são as experiências acadêmicas que ela proporciona e se envolva em alguma delas, porque, assim, você está enriquecendo a sua história, a sua narrativa e está construindo um dos principais pilares de gestão de carreira: ativo de relacionamento.